"Ando devagar/porque já tive pressa..."

"Ando devagar/porque já tive pressa..."
"Nessa loooonga estraaaaada da viiidaaa..."

Blog destinado a narrar as vivências do autor, através de suas opiniões sobre fatos vividos, e de marcações cronológicas, objetivando deixar para descendentes e amigos suas impressões sobre passagens de sua vida, abrangendo pessoas com sd quais se relacionou e instituições em que laborou, tudo com a visão particular, própria de todo ser humano, individualizada, pois cada pessoa tem sua forma de pensar, ser e viver. Madeira

quarta-feira, 7 de maio de 2008

vivencias-madeira-cronológica (1964/4)



1964: enquanto eu vibrava na BIB, Terezinha trabalhava na Mesbla, a maior loja de departamentos do Rio, situada na Lapa em frente ao Passeio Público, de frente para o aterro da Glória, em um prédio de nove andares próprio e utilizado somente por ela, tendo como símbolo um relógio no topo que até hoje (a Mesbla não mais existe) é conhecido como o relógio da Mesbla. As lojas de departamento (à época existia outra grande no Rio, a Sears) foram as precursoras dos shoppings, pois reuniam todos os artigos passíveis de comercialização em um só local - com tudo pertencendo a uma só empresa. A Mesbla vendia de tudo, até aviões de pequeno porte e lanchas, além de miudezas como bijuterias. Era de origem francesa, como algumas de suas gerentes. Loja chique, vendia somente artigos de primeira qualidade. Seus vendedores passavam por uma seleção rigorosa, cursos continuadamente e vestiam-se de forma impecável, com belos uniformes. A família de Terezinha tinha origem humilde, sendo o pai José Coelho, português, possuidor de uma inteligência apurada mas de poucas letras - como quase todo imigrante luso -, e tinha inclusive levado a esposa, a filha e a sobrinha Ivone para uma temporada em Portugal, onde nasceu o único irmão de Terezinha, o Ismael. Depois de alguns anos voltou ao Brasil, tendo - como era típico dos lusitanos - se estabelecido com um comércio (um bar). A mãe, Hilda Botelho Coelho, brasileira, filha de portugueses, raçuda e trabalhadora era a esposa dotada de gênio forte, ao contrário de Seu José, tranquilo, bom de papo. Formavam um casal que nada tinha em comum. Os negócios com o bar não deram resultado, perderam tudo e então viraram feirantes, com as dificuldades financeiras aumentando (e estas sempre existiram). Terezinha, aos quatorze anos, então idade mínima para trabalhar, candidatou-se a um emprego na Mesbla. Tendo sido aprovada, foi contratada e designada para trabalhar na seção de meias femininas, no térreo do prédio, sob a gerência de uma senhora francesa muitíssimo exigente (o que sempre é muito bom, pois força o desenvolvimento de quem quer crescer), enquanto que em paralelo a prima Ivone o era para trabalhar na seção de cama e mesa, no terceiro andar. Assim conheci Terezinha: pobre, trabalhando fora, sem poder estudar, inteligente, com muita garra. Pegava um ônibus para a Lapa cedinho (pois às oito horas já tinha de estar no trabalho), sempre em pé e espremida, e voltava quase sempre depois das vinte e duas, dada a necessidade de buscar a hora-extra. Muito bonita, com uma classe no vestir e comportar incomum, papo de primeira e personalidade forte, fortíssima. Todo esse conjunto impressionou-me e levou-me a um amor muito forte, e à certeza de que seria ela a companheira de uma vida a dois a ser construída. Desde o início procurei facilitar tudo para ela e protegê-la, indo buscá-la todas as noites e ficando ao máximo atento às suas necessidades e a dos pais. A feira nem sempre rendia bom dinheiro, além dos problemas com fiscais corruptos, e demandava sacrifícios imensos. Seu José tinha de ir comprar o que ele ia revender no dia (a feira era cada dia em um bairro diferente) de madrugada, no mercado central, o que correspondia a sair de casa às duas horas da manhã para comprar a melhor mercadoria, acertar a entrega na feira daquele dia, deslocar-se (tudo de ônibus) para a mesma, aguardar a entrega, montar a barraca e arrumar o que tinha sido comprado. Seu José era especializado em tomates. Só comprava e vendia tomates, e tinha freguesia certa pelo jeito tranquilo de vender. À tarde, acabados os tomates, tinha de desmontar a barraca, entregá-la para ser levada - para no dia seguinte ser entregue desmontada no outro local de feira - e então ia ao mercado central fazer a encomenda do material para o dia seguinte; ou seja, uma jornada que ia das duas da madrugada de um dia até as quatro/cinco horas da tarde, quando ele chegava em casa para almoçar. Em algumas feiras mais movimentadas Dona Hilda ia se encontrar com ele para apoiar na venda, o que quer dizer que ela saía às cinco/seis horas direto (de ônibus) para o local da feira e vinha pelas treze para casa. Eram dois leões trocando trabalho por subsistência, sobrevivendo. E quando chovia ou o tomate vinha ruim não tinha dinheiro. Por isso o dinheiro de Terezinha acabou sendo imprescindível. Assim os conheci e aprendi a admirá-los e honrá-los. Madeira

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